FESA Entrevista Valéria Baracatt, fundadora do Instituto Arte de Viver Bem, ONG que ajuda a combater o câncer de mama
Em outubro, conversamos com Valéria Baracatt. Psicóloga e jornalista com extensão em marketing, ela é fundadora do Instituto Arte de Viver Bem (IAVB), ONG cuja missão é colaborar para diminuir a taxa de óbito por câncer de mama no Brasil, melhorando a qualidade de vida das mulheres tanto na prevenção, como em tratamento. Outro objetivo do Instituto é trabalhar para melhorar a política pública e dos mamógrafos do país.
No quadro FESA Entrevista deste mês, Valéria falou sobre a importância do tema da prevenção ser trabalhado nas empresas, o papel dos RH nesse processo e como as organizações podem acolher funcionários que tenham o câncer detectado ou estejam retornando do tratamento da doença.
Confira!
Conte sobre a sua trajetória e o que a motivou a criar o Instituto Arte de Viver Bem
O Instituto Arte de Viver Bem nasce do limão à limonada. Sempre fiz trabalhos sociais ou ambientais. Como tive câncer de mama, fui estudar e vi que não tinham muitas informações, e comecei a passar para os meus colegas jornalistas. Sou jornalista, tenho extensão em marketing, sou psicóloga e trabalho com sustentabilidade a vida inteira. Abri o Instituto para passar formalmente mais informações e dar acolhimento a estas pacientes e familiares.
Existe muito abandono. Em 2005, sofri pela primeira vez com a discriminação no mercado de trabalho. Aí eu vi que realmente tinham tirado meu chão. Por isso que eu uso a frase “o pior câncer é o preconceito”. Percebi que estar com câncer de mama não tirou o meu chão; me deu forças para lutar. O que tirou o meu chão foi ser discriminada no mercado de trabalho. Como vou pagar um tratamento de alto custo se não tenho como me manter? Tinha uma reserva, porque sempre tive bons trabalhos e clientes, mas pensei “como vou fazer se eu passei a gastar cinco vezes mais do que eu ganhava?”.
Fui amadurecendo, escrevi artigos — o primeiro foi para a extinta, porém importante, Gazeta Mercantil — sobre a discriminação no mercado de trabalho e deu um impacto muito grande. De lá para cá, tenho sido uma voz constante. Duas instituições entraram para fazer esse mesmo trabalho que desenvolvo há 19 anos. É importante ser essa voz ativa. Eu não dirijo o Instituto desde o final de 2022, ele foi para o Norte, pois lá eles precisam lidar com o básico: políticas públicas e conseguir o remédio, é o básico do básico. Já estava desgastada e precisando refazer a minha carreira.
Fomos fazendo um trabalho gradual e passando informação para a imprensa, impactando a sociedade. Entraram os estagiários, no conselho mais dois jornalistas. Eu batia nas grandes agências e pedia campanhas. Tudo para repercutir aqui como forma de campanha publicitária, passando informação e atendendo aos pacientes e familiares, que não sabem muito bem como lidar com a situação. Não tem uma peruca, um lenço, próteses, não tem acesso a sutiã que possa ser usado para mastectomizadas. Tudo isso num processo de colaboração em todo o Brasil.
Isso cresceu muito e fizemos um trabalho muito bom não só de conscientização da importância de tratar bem, de acolher bem as mulheres, mas também por conta dos abandonos na família e no mercado de trabalho. Fomos aos poucos conscientizando a população da necessidade de acolhimento e ajudando na ponta. Fizemos o “Geração de Renda”, para capacitar as mulheres que não conseguiam entrar no mercado de trabalho para serem maquiadoras nos seus bairros ou manicures. Compramos laptops para ensinar digitação e a usar os programas, para entrar no mercado como secretária júnior. E no lado empresarial dei muitas palestras nas empresas, viajei de norte a sul pelo Brasil palestrando para conscientizar sobre a importância de se ter qualidade de vida, pois ela impacta muito na produtividade.
Se o gestor souber incentivar os seus colaboradores a ter qualidade de vida, isso impacta diretamente na produtividade. É dar assistência aos colaboradores e acompanhá-los. Ganha o colaborador e a empresa, que o terá de volta. Ele se cura mais rápido porque o emocional dele ganha muito.
Você sente que há uma movimentação nas empresas para que o tema do câncer de mama seja mais falado e cresça o combate ao problema?
Infelizmente, só se fala no Outubro Rosa, vem essa enxurrada de informações e eu sempre falei no Instituto que são o Outubro Rosa e mais 11 meses do ano. São 12 tons de rosa. Isso é importante abordar o ano inteiro. As pessoas ficam muito cansadas de ouvir todo ano a mesma ladainha em outubro. Seria melhor diluir a informação do que ficar batendo na mesma tecla todo ano.
Em muitas empresas, fui chamada para outros meses: o mês da mulher, em fevereiro — quando há o dia mundial de combate ao câncer —, abril tem um dia também. Em novembro, dia 27, é o dia nacional de combate ao câncer de mama. E são programas que geram qualidade de vida, controlando a alimentação e impactando na produtividade. Isso gera aumento de vendas para as empresas, está tudo relacionado.
O Outubro Rosa segue sendo uma agenda forte e relevante nas empresas, na sua opinião?
Todo mundo faz. Uma vez, uma empresa não quis fazer, mas aí montaram todo um programa completo que falava de qualidade de vida, não só durante aquele período. Eles fizeram algo maior e acho que é isso que toda empresa deveria fazer. Fazer uma coisa mais abrangente. Tem que pensar em disseminar muito a informação para impactar todos os gestores mesmo — ou a grande maioria — para que isso seja uma regra, não a exceção. É importante pensar na boa vontade e na consciência de gestores, que sabem que a qualidade de vida impacta na produtividade.
Por que é importante que os RHs falem do tema com os colaboradores?
Quanto mais qualidade de vida o colaborador tiver, se a empresa incentivar a atividade física, a boa alimentação, mostrar que qualidade de vida é importante para a vida pessoal dele e da família, ele vai chegar mais disposto na empresa, com muito mais garra de trabalho. Com isso, as empresas vão ganhar colaboradores mais dispostos e mais felizes.
Está comprovado que a endorfina e a serotonina são hormônios do prazer e da felicidade. Então, quanto mais você liberar isso naturalmente ao invés de tomar medicamento contra a depressão, por exemplo, mais ele vai se sentir disposto e entregar muito mais para a empresa. Vai ter mais garra, trabalhar com mais vontade, e aí aumenta a produtividade, a interatividade e colaboração entre todos. Só benefícios para a vida pessoal e profissional.
Outro ponto é o de chamar a equipe e mostrar que o acolhimento é a melhor solução. É muito importante que o RH tenha essa participação no processo da gestão. O colaborador precisa deste apoio emocional que parta da empresa — não o isolamento, mas sim o acolhimento. E fazer a equipe entender que é um processo passageiro.
Quando ele sai do tratamento, ele estará melhor de saúde e tem mais condições de voltar ao trabalho — quando há licença — de voltar bem. Alguns nem querem sair, o processo de quimioterapia não afeta tanto.
Uma tecla que você bate muito é a do preconceito em processos seletivos ou num potencial retorno ao mercado quando se comenta sobre a doença. Como podemos combater esse tipo de situação e o que os gestores e RHs podem fazer?
Em primeiro lugar, entender que aquele processo é momentâneo e que o colaborador irá melhorar a cada dia. Ouvir este paciente trabalhador. Por isso que o RH é tão importante, ouvir as necessidades dele e entender que ele pode ser útil até fazendo um sistema híbrido, se ele estiver fatigado do processo, pode voltar até antes da licença e o RH incentivá-lo a uma parte do tempo ficar em casa com atividades. E aproveitar o preparo do RH para ouvir como ele está psicologicamente. Falar com a equipe dessa pessoa que este processo é passageiro, ele vai voltar à normalidade. E que todos precisam entender isso.
Se ele for meio período a princípio e todos entenderem isso, no futuro será benéfico para todos. O acolhimento dos demais colaboradores é fundamental também. Oferecer café ou água, isso é um carinho muito importante para ele. Outro gesto: convidar para almoçar com o time. E isso o líder pode fazer, ir acolhendo e delegando funções, não só as pequenas, mas também as maiores. Ajudar no processo de reintegração na empresa.
No início da conversa falamos sobre o impacto positivo. E a criação do Instituto também impacta vidas de forma positiva. Passe uma mensagem final sobre esse impacto que você idealizou e como o IAVB gerou impacto
Acredito muito no acolhimento, no que fizemos no instituto. O acolhimento salva-vidas. As empresas entendendo isso, elas certamente teriam um programa de qualidade de vida, porque é muito importante que esta pessoa seja acolhida pela família, pelos amigos e pelas empresas. Que tenhamos um olhar mais humano. É como costumo dizer: o psicólogo ajuda na cura, quanto mais acolhido ele for, melhor. O pior câncer não é o que atinge a carne, mas o que fere a alma. O pior câncer é o preconceito.
A FESA Group, como o mais completo ecossistema de soluções integradas de RH da América Latina e uma empresa que visa sempre ter um olhar genuíno em prol de seus colaboradores, gostaria de reforçar a importância do tema no ambiente corporativo ao longo de todo ano. O Outubro Rosa é uma data muito importante no combate e prevenção ao câncer e queremos chamar a atenção para que haja o cuidado com os colaboradores o ano todo. É fundamental o olhar das empresas e o cuidado diário em relação a um tema tão importante para a saúde de todos.